Naturalismo Integral: Desenhos: Galeria Suzanna Sassoon, São Paulo

29 Março - 4 Abril 1984

Sepp Baendereck na trilha de Humboldt

 

No primário em Hodzag, iugoslávia, Sepp Baendereck desenhava cavalos. Quando havia inspetores, os desenhos de Sepp no quadro negro, eram o orgulho das freiras. O prazer, o deleite que o menino sentia em desenhar cavalos, reencontramos hoje nesta exposição. A primeira, de desenhos, aquarelas e gravuras que Sepp Baendereck apresenta no Brasil. Se antes não o fez, foi porque achou que não era a hora. Que seus desenhos eram da melhor qualidade, não tinha dúvidas. Não foi por acaso que em 1947, o Museu Albertina de Viena, adquiriu um deles.

Agora, depois de tantas exposições de pintura, a hora de mostrar desenhos, gravuras, chegou. Os trabalhos reunidos nesta mostra são parte de um processo em desenvolvimento. Longo. Meticuloso. Anos atrás, por ocasião de uma exposição realizada no Rio de Janeiro, Sepp Baendereck escreveu: “Aos 6 anos de idade desenhava cavalos, aos 10, barcos, aos 20, o corpo humano, aos 25 gravava xilos, aos 35 pintava signos e símbolos e aos 48 voltei à figura, aos animais, às flores e às paisagens”.

Nestas poucas linhas Baendereck sintetizou com precisa concisão a figura lhe é primordial. Essencial. Afirmaria mesmo, vital. Ao retomá-la por volta de 68, definiu o seu percurso. Esta exposição é conseqüência natural da opção tomada. Seria facílimo para Sepp Baendereck desenhar, pintar abstrações. Porém esta facilidade dificilmente corresponderia aos seus anseios mais profundos.

Visceralmente ligado à natureza, Sepp Baendereck corresponde com perfeição à definição do que é um artista, concebida por Bacon: “homo aditus naturae”, isto é, o homem associado à natureza. Para o filósofo, não existe criação artística sem a natureza. Ignorá-la é negar a si mesmo. Negar o criador, a criação, a criatura. 

Sepp Baendereck compreendeu que era impossível permanecer alheio, indiferente às cores, às formas, à extasiante beleza da natureza brasileira. O primeiro choque foi em 1948. Ao chegar ao Rio de Janeiro. À Ilha das Flores. Ao deslumbrar-se com a paisagem, com a baía, com as praias, com negros de terno de linho branco, sapatos de bico fino. O segundo, em 1974 ao descobrir, maravilhado o Amazonas.

Dez anos depois, esta mostra de desenhos, aquarelas e gravuras, faz parte do fascinante percurso que Sepp Baendereck vem percorrendo desde o dia em que desenhou seu primeiro cavalo. Se tivesse nascido no século passado em Paris, Sepp Baendereck sem dúvida teria integrado ao lado de Theodore Rousseau e Courbet, L’Ecole de Barbizon. Próxima à floresta de Fontainebleu. O amor quase religioso que os artistas de Barbizon devotaram à natureza encontra ressonâncias na obra que Baendereck vem realizando.

Somente a compreensão da natureza amazônica em sua grandiosidade, permitiu a Sepp Baendereck a retomada de uma postura artística iniciada pelos artistas viajantes” inspirados por Alexander Von Humboldt. Ao ver a fauna, a flora, captadas nos desenhos, aquarelas e gravuras desta exposição, sinto que o naturalismo apregoado por Humboldt não terminou na obra por ele iniciada e desenvolvida por Rugendas, Martius, Ender e outros. Continua na obra de Sepp.

Quando em 3 de janeiro de 1810 Humboldt escreveu a Goethe: “A natureza precisa ser sentida; quem apenas vê e abstrai, poderá desmembrar plantas e animais durante toda uma vida na tropelia vital do ardente mundo tropical; acreditará estar descrevendo a natureza; porém ser-lhe-á completamente estranho”, deixou bastante claro que o amor à natureza é básico.

Esse amor, Sepp Baendereck tem de sobra. Quem souber ver o encontrará nos desenhos, aquarelas e gravuras aqui expostos, compreendendo de imediato a linguagem do artista. Quem não souber bem, terá que aprender...

Carlos Von Schmidt, membro da APCA ABCA AICA

07/03/1984

A bordo do Juruena, Angra dos Reis, Ilha da Gipóia.