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25 Outubro - 5 Novembro 1977
"Como todas as cousas têm fim, convém que tenham princípio, e como o de minha pretensão é manifestar a grandeza, fertilidade e outras grandes partes que tem a Bahia de Todos os Santos e os demais Estados do Brasil, do que se os Reis passados tanto se descuidaram; a El-Rei Nosso Senhor convém, e ao bem do seu serviço, que lhe mostre, por estas lembranças, os grandes merecimentos deste seu Estado, as qualidades e estranhezas dele, etc.: para que lhe ponha os olhos e bafeje com seu poder; o qual se engrandeca e estenda a felicidade, com que se engrandeceram todos os Estados que reinam debaixo da sua proteção; porque está muito desamparado depois que El-Rei D. João III passou desta vida para a eterna, o qual o principiou com tanto zelo, que para o engrandecer meteu nisso tanto cabedal, como é notório, o qual se vivera mais dez anos, deixara nele edificadas muitas cidades, vilas e fortalezas mui populosas, o que se não efetuou de pois do seu falecimento, antes se arruinaram algumas povoações que em seu tempo se fizeram. Em reparo e acrescentamento estará bem empregado todo o cuidado que Sua Majestade mandar ter deste novo reino; pois está capaz para se edificar nele um grande império, o qual com pouca despesa destes reinos se fará tão soberano, que seja um dos Estados do mundo, porque terá de costa mais de mil léguas, como se verá por este Tratado no tocante à cosmografia dele, cuja terra é quase toda muito fértil, mui sadia, fresca e lavada de bons ares, e regada de frescas e frias águas..."
"...É esta província mui abastada de mantimentos de muita substância e menos trabalhosos que os de Espanha. Dão-se nela muitas carnes assim naturais dela, como das de Portugal, e maravilhosos pescados; onde se dão melhores algodões que em outra parte sabida, e muitos açúcares tão bons como na Ilha da Madeira. Tem muito pau de que se fazem as tintas. Em algumas partes dele se dá trigo, cevada, e vinho muito bom, e em todos os frutos e sementes de Espanha, do que haverá muita qualidade, se Sua Majestade mandar prover nisso com muita instância, e no descobrimento dos metais que nesta terra há; porque lhe não falta ferro, aço, cobre, ouro, esmeralda, cristal, e muito salitre..."
"Como não há cousa que se encubra aos homens que querem cometer grandes empresas, não pode estar encoberto este rio do mar doce ou das Amazonas ao capitão Francisco de Arelhana que, andando na conquista do Peru em companhia do governador Francisco Pizarro, e indo por seu mandado com certa gente de cavalo descobrindo a terra, entrou por ela dentro tanto espaço que se achou perto do nascimento deste rio. E vendo-o caudaloso, fez junto dele embarcações, segundo o costume daquelas partes, em as quais se embarcou com a gente que trazia e se veio por este rio abaixo, em o qual se houveram de perder por levar grande fúria e correnteza, e com muito trabalho tornou a tomar porto em povoado; na qual jornada teve muitos encontros de guerra com o gentio e com um grande exército de mulheres que com ele pelejaram com arcos e flechas, donde o rio tomou o nome das Amazonas..."
"NOTÍCIAS DO BRASIL" - Gabriel Soares de Souza, 1587